Apesar da queda no número de casamentos civis em 2023, a união homoafetiva entre mulheres aumentou 4,9% no mesmo período. A constatação está nas Estatísticas do Registro Civil, divulgadas ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pelo levantamento, foram realizados 940.799 casamentos, o que representa uma redução de 3% em relação a 2022, tanto para casais heterossexuais, quanto para relações homoafetivas masculinas.
Moradoras de Fortaleza, Carolina Rocha, 49 anos, e Raquel Morano, 35, oficializaram a união em 3 de novembro do ano passado, após quase dois anos de relacionamento. A decisão veio tanto pelo desejo de celebrar o amor com família e amigos,m quanto por um temor crescente de retrocessos. “A gente resolveu casar porque estava com medo de que proibissem. Tinha um burburinho no Congresso sobre vetar o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Não queríamos correr o risco”, conta Carolina.
O processo de oficialização, segundo elas, foi tratado com normalidade. “A gente não sentiu nenhum tipo de resistência, nem um acolhimento especial. O cartório era de um amigo gay, onde outros casais já tinham se casado. Foi tudo muito tranquilo, parecia um casamento como outro qualquer”, afirma Raquel. A escolha por um local conhecido ajudou a garantir mais segurança e conforto no momento da celebração.
Apesar de não desejarem filhos juntas, a experiência com a parentalidade faz parte da rotina do casal. “Tenho dois filhos, uma adolescente e uma jovem adulta, e tenho guarda compartilhada com o pai deles. A Raquel, mesmo sem nunca ter tido o desejo de ser mãe, acaba exercendo essa função comigo”, relata Carolina. Para elas, a discussão sobre guarda entre casais homoafetivos deve seguir os mesmos critérios aplicados a casais heterossexuais. “A lei precisa tratar com igualdade.”
Tendência de queda
Desde 2016, segundo a pesquisa, o número total de registros de casamento vem apresentando tendência de queda. Houve, contudo, um decréscimo ainda mais expressivo entre 2019 e 2020 — atribuída aos efeitos da pandemia de covid-19.
Entre 2020 e 2021, o número de casamentos aumentou, dando indícios de que as cerimônias matrimoniais voltaram a acontecer, em razão das campanhas de vacinação e da flexibilização das medidas para contenção da covid- 19. De 2021 a 2022, o número de casamentos também cresceu, mas ainda continuou abaixo da média de uniões registradas antes da pandemia. Em 2023, no entanto, o número voltou a cair.
Os matrimônios homoafetivos voltaram a bater recorde: somaram 11.918 registros, o maior número desde 2013, quando o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) regulamentou o casamento civil para casais LGBTQIA+. Ainda assim, essas uniões representam apenas 1,9% do total de casamentos registrados em 2023.
Em relação ao número de registros de casamentos civis entre cônjuges do mesmo sexo, foi observado aumento de 1,6% entre 2022 (11.022) e 2023 (11.198). Em 2023, foi registrado o maior número de casamentos entre pessoas do mesmo sexo desde 2013, quando a série foi iniciada. Segundo o IBGE, há um envelhecimento no perfil dos noivos. A idade média das mulheres ao se casarem subiu para 29,2 anos, enquanto entre os homens chegou a 31,5 anos.
A única região que registrou aumento no número de casamentos foi o Centro-Oeste — alta de 0,8% —, que também apresentou a maior taxa de nupcialidade do país: 6,5 uniões civis por mil habitantes. Além disso, foi a única área com crescimento no número de nascimentos, contrariando a tendência nacional de queda.
As unidades da Federação com a maior taxa de casamentos legais, por mil habitantes, são: Rondônia (9,1), Acre (8,5) e Distrito Federal (7,9) — a média do Brasil é de 5,6. As taxas mais baixas estão no Rio Grande do Sul (3,9), em Sergipe (3,8) e no Piauí (3,7).
Ainda assim, os números no DF mostram que os casamentos diminuíram 8,2%, enquanto que os divórcios aumentaram 9,1%. Houve 18.824 registros de casamentos civis realizados em Cartórios de Registro Civil de Pessoas Naturais, em 2023. No ano anterior foram observados 20.502. A queda observada no DF supera o âmbito nacional (3%).
O levantamento mostra, ainda, que os casamentos entre pessoas divorciadas ou viúvas quase triplicaram nas últimas duas décadas. Em 2003, essas uniões representavam 12,9% do total e, em 2023, já somavam 31,3%. A idade média nesses casos é significativamente mais alta: 41,3 anos para as mulheres e 45,2 anos, para os homens.
Além disso, caiu o tempo médio de duração dos casamentos. Em 2010, era de aproximadamente 16 anos, enquanto que, em 2023, reduziu para 13,8.
Divórcio dispara
As Estatísticas do Registro Civil mostram que os divórcios atingiram o maior patamar já registrado. Entre 2022 e 2023, foram 440.827 separações e quase metade desses divórcios envolveu casamentos com menos de 10 anos. Além disso, mais da metade das separações (53%) ocorreu entre casais com filhos menores de idade.
O número de divórcios cresceu 4,9% entre 2022 e 2023. A taxa geral de divórcios (o número de divórcios para cada mil habitantes) foi de 2,8 em 2023. Os maiores índices foram verificados em Rondônia (5,0), Distrito Federal (4,2) e Mato Grosso do Sul (3,8). As menores são as do Piauí (1,3), do Pará (0,8) e de Roraima (0,3).
O levantamento do IBGE chama atenção, também, para o crescimento da guarda compartilhada. Entre os divórcios judiciais com filhos pequenos, essa modalidade passou de 7,5%, em 2014, para 42,3%, em 2023. O tempo médio entre o casamento e o divórcio também encurtou, passando de 16 anos, em 2010, para 13,8 anos no ano passado.
A guarda compartilhada cresceu 526%, em um período de 10 anos, no Distrito Federal. Em 2014, a proporção era de 10,4% na capital federal, mas, em 2023, passou a representar 65,4%.
Segundo o IBGE, o aumento é consequência da Lei 13.058, de 2014, em que a guarda compartilhada passou a ser priorizada. “A Lei do Divórcio (Lei 6.515, de 26/12/1977) prevê a guarda compartilhada de filhos menores de idade em caso de divórcio. Contudo, somente com a Lei 13.058, de 22/12/2014, essa modalidade passou a ser priorizada ainda que não haja acordo entre os pais quanto à guarda dos filhos, desde que ambos estejam aptos a exercer o poder familiar. Isso porque, de acordo com a referida lei, o tempo de convívio deve ser equilibrado entre o pai e a mãe, salvo se um deles declarar que não deseja a guarda do menor”, salienta o IBGE.
Menos filhos
Ano a ano as brasileiras estão tendo menos filhos. Em 2023, o país viu o número de nascimentos cair pelo quinto ano seguido. Foram 2,52 milhões de nascidos, uma redução de 0,7% na comparação com 2022. Essa quantidade de nascimentos é 12% menor que a média nos cinco anos anteriores à pandemia de covid-19 — de 2015 a 2019 (2,87 milhões). O número total de registros de nascimentos chega a 2,6 milhões, em 2023, mas o IBGE esclarece que 2,9% deles (75 mil) são de pessoas que nasceram em anos anteriores, só que registradas somente em 2023.
O IBGE apresentou, também, uma série histórica iniciada em 1974 com números de nascimentos ocorridos e registrados no ano, porém excluídos os dados em que a residência da mãe não é conhecida ou é no exterior. Nesta série, o número de registros de 2023 (2,518 milhões) é o menor desde 1976 (2,467 milhões).
Apesar da tendência de diminuição no número de nascimentos, a gerente da Pesquisa de Registro Civil, Klivia Brayner de Oliveira, pondera que a constatação de ser o menor quantitativo da série em quase 50 anos tem que levar em consideração o sub-registro, que era maior no passado — hoje, segundo ela, os dados estão muito próximos da realidade.
Para a pesquisadora, a diminuição no número de nascimentos tem a ver com fatores como custos para criar crianças, disseminação de métodos contraceptivos, inclusive entre pessoas de baixa renda, e outras prioridades das mulheres, como trabalho e formação.
O levantamento mostra que as mães brasileiras estão decidindo ter filhos em idade mais avançada. Em 2003, 20,9% dos nascidos foram gerados por mulheres de até 19 anos, percentual que caiu para 11,8% em 2023. Já quando a mulher 30 anos ou mais, as proporções passaram de 23,9% para 39% no período. Entre mães com 40 anos ou mais, a marca dobrou, indo de 2,1% para 4,3%. Em 2023, foram 109 mil nascimentos de mães nessa faixa etária. Por regiões, o Norte e o Nordeste apresentam maior participação de mulheres de até 19 anos que tiveram filhos em 2023 — 18,7% e 14,3%, respectivamente. (Com agências Brasil e Estado)
*Estagiária sob a supervisão de Fabio Grecchi
Alícia Bernardes
Alícia Bernardes é graduanda de Jornalismo e Comércio Exterior pela UDF. Integrante da Women Inside Trade (WIT), iniciativa que promove a participação feminina no comércio internacional, já estagiou no Poder360, atuando na produção das newsletters do jorn
Fonte: www.correiobraziliense.com.br
Publicado em: 2025-05-17 03:55:00 | Autor: |